Uma análise de possíveis convergências entre o mindfulness e o processo de exposição
Resumen
O Mindfulness é baseado em práticas contemplativas orientais, especialmente Zen-Budistas, e foi introduzido no contexto científico e terapêutico ocidental pelo biólogo americano Jon Kabat-Zinn, deste então, tem sido adotado por modelos de terapia comportamentais de terceira onda. Seu uso é realizado através de práticas contemplativas e exercícios de atenção direcionada, sendo os principais elementos a aceitação e observação voluntária da realidade como se apresenta. A prática tem se mostrado eficaz no tratamento de diversas condições clínicas, como depressão, ansiedade e transtornos de personalidade. Além disso, estudos indicam que a prática regular pode promover mudanças no comportamento e melhorar a qualidade de vida. O presente estudo questiona a relação entre a prática de Mindfulness e a técnica de exposição, partindo da hipótese de que o mecanismo subjacente à prática está relacionado com os mesmos processos presentes na exposição. Apesar de sua adoção por psicólogos ocidentais e diversas pesquisas demonstrarem resultados positivos, o mecanismo comportamental subjacente que explica o funcionamento ainda carece de melhor esclarecimento, com isso percebe-se a importância de investigar os mecanismos subjacentes a essa prática e seus efeitos em diferentes populações. Assim, o objetivo do presente resumo é verificar a relação conceitual entre Mindfulness e terapia de exposição. O estudo consiste em uma revisão de literatura narrativa qualitativa exploratória utilizando-se de livros técnicos selecionados de forma sistemática através de busca em bases de dados especializadas e em referências bibliográficas de artigos e livros já conhecidos. A análise dos materiais se deu por meio de categorização temática e análise crítica do conteúdo. As práticas de Mindfulness integradas às terapias psicológicas ocidentais estão baseadas na observação e aceitação da realidade como ela se apresenta, no exercício de modular a atenção e na mudança ativa de postura em relação aos eventos privados desagradáveis, como pensamentos aversivos e emoções dolorosas. Elas partem do princípio Zen-Budista de que a dor faz parte da vida, portanto inevitável. Sua aceitação sem julgamento é a forma de enfrentamento, entretanto o ser humano busca fugir ativamente de eventos que possam levar ao sofrimento. Para Hayes (2021) é a evitação do contato com estímulos privados considerados aversivos, como pensamentos, sensações, sentimentos e emoções, a causa do sofrimento humano. Esse processo foi batizado de esquiva experiencial e é central às abordagens terapêuticas que adotam o Mindfulness. A luta para evitar eventos privados aversivos pode aumentar e prolongar o sofrimento. Por isso, uma proposta de intervenção é aceitar que algumas dores são inevitáveis. Isso pode levar a um sofrimento menor. A intervenção é baseada na aceitação dos sentimentos, pensamentos e sensações dolorosas que o sujeito sente. O indivíduo deve entrar e permanecer em contato com essas sensações, mesmo que deseje fugir ou evitá-las. Tal procedimento se dá através da observação, descrição e contato ativo com os estímulos, mesmo que sejam desagradáveis, em um processo que tende a diminuir progressivamente a dor e o sofrimento, caracterizando a exposição. Deve-se frisar que um fator presente na prática é o distanciamento voluntário dos aversivos enquanto observados sem julgamento e desconectados do sujeito, o que diminui a aversividade, mas não elimina os estímulos. Deve-se evidenciar que o descrito anteriormente é congruente com pesquisas científicas de base analítico comportamental e a filosofia Behaviorista Radical, tendo em vista que eventos privados ou públicos possuem propriedades para eliciar respostas reflexas (agradáveis ou desagradáveis), adquiridas a partir de uma história de aprendizado prévio através de condicionamento respondente (emparelhamentos), operante (modelagem), aprendizagem indireta (modelação) ou aprendizagem por meio de comportamento verbal (regras ou relações de equivalência). É necessário levar em conta que os estímulos aversivos selecionam respostas operantes para evitá-los previamente, que são reforçadas negativamente a partir de sua remoção ou ausência, sendo possível classificar a esquiva experiencial como um comportamento operante reforçado negativamente resultante da fobia das próprias emoções. É comum que pessoas com pensamentos e sentimentos aversivos criem estratégias para evitá-los ou fugir deles, pois tendem a eliciar outros respondentes dolorosos, geralmente manejando o ambiente para evitar algo que dispare o evento privado doloroso ou criando distrações com finalidade de evitá-los em sua presença. Pode-se perceber que a simples exposição ao aversivo privado leva a uma cadeia comportamental problemática, incluindo respondentes e operantes, e que os processos de seleção e manutenção da esquiva experiencial são semelhantes ao da esquiva de estímulos públicos. Assim, existem respostas operantes selecionadas para evitar uma classe de respostas privadas reflexas aversivas que produzem alívio imediato e eliciam respostas privadas aversivas atrasadas. A exposição é uma técnica que envolve expor o sujeito aos elementos fóbicos através de uma hierarquia de contato, que tende a limitar a esquiva, e parte dos princípios de extinção e habituação, onde o organismo se adapta ao estímulo assim como o estímulo condicionado tende a perder a propriedade de eliciação a partir de múltipla exposição sem a presença do incondicionado. Deve-se destacar que a esquiva experiencial tende a perpetuar e fortalecer o problema, pois ao evitar o estímulo aversivo não desenvolve repertório de enfrentamento, bloqueia a exposição e produz aversivos privados atrasados, como sentimento de culpa ou ruminação, trazendo mais sofrimento. É possível perceber que a prática Mindfulness possui elementos de exposição, pois a observação de estímulos fóbicos privados de forma controlada leva ao sujeito a se expor e dá a oportunidade do organismo passar pelos processos de habituação e extinção, bem como o distanciamento voluntário dos aversivos age para limitar a esquiva ao reduzir a o grau de aversividade presente, o que aumenta o engajamento. Assim, a prática seria apenas uma variação da exposição em si e sua eficácia estaria ligada a esse fator. Conclui-se que o Mindfulness leva à exposição de estímulos privados eliciadores de respostas reflexas aversivas, como sensações físicas e psicológicas dolorosas, o que é realizado em conjunto com a limitação ativa da esquiva. O trabalho estabeleceu uma relação entre a prática e técnicas de exposição, evidenciando o papel da habituação e da respondente, entretanto são necessários novos estudos, principalmente de cunho experimental, para investigar tal relação, tendo em vista se tratar de um trabalho teórico conceitual.
Descargas
Publicado
Número
Sección
Licencia
Esta obra está bajo una licencia internacional Creative Commons Atribución-NoComercial 4.0.